PEQUENA ANTOLOGIA GOIABAL 19
Albert Camus (1913-1960)
"Há crimes de paixão e crimes de lógica. O código penal distingue um do outro, muito comodamente, pela premeditação. Estamos na época da premeditação e do crime perfeito. Nossos criminosos não são mais aquelas crianças desarmadas que invocavam a desculpa do amor. São, ao contrário, adultos, e seu álibi é irrefutável: a filosofia pode servir para tudo, até mesmo para transformar assassinos em juízes.
Heathcliff, em 'O Morro dos Ventos Uivantes', seria capaz de matar a terra inteira para possuir Kathie, mas não teria a idéia de dizer que esse assassinato é racional ou justificado por um sistema. Ele o cometeria, aí termina toda a sua crença. Isso implica a força do amor e caráter. Sendo rara a força do amor, o crime continua excepcional, conservando desse modo o seu aspecto de transgressão. Mas a partir do momento em que, na falta de caráter, o homem corre para refugiar-se em uma doutrina, a partir do instante em que o crime é racionalizado, ele prolifera como a própria razão, assumindo todas as figuras do silogismo. Ele, que era solitário como o grito, ei-lo universal como a ciência. Ontem julgado, hoje faz a lei."
"(...) No momento em que o crime se enfeita com os despojos da inocência, por uma curiosa inversão peculiar ao nosso tempo, a própria inocência é chamada a justificar-se."
("O Homem Revoltado", introdução, 1951.)
Albert Camus (1913-1960)
"Há crimes de paixão e crimes de lógica. O código penal distingue um do outro, muito comodamente, pela premeditação. Estamos na época da premeditação e do crime perfeito. Nossos criminosos não são mais aquelas crianças desarmadas que invocavam a desculpa do amor. São, ao contrário, adultos, e seu álibi é irrefutável: a filosofia pode servir para tudo, até mesmo para transformar assassinos em juízes.
Heathcliff, em 'O Morro dos Ventos Uivantes', seria capaz de matar a terra inteira para possuir Kathie, mas não teria a idéia de dizer que esse assassinato é racional ou justificado por um sistema. Ele o cometeria, aí termina toda a sua crença. Isso implica a força do amor e caráter. Sendo rara a força do amor, o crime continua excepcional, conservando desse modo o seu aspecto de transgressão. Mas a partir do momento em que, na falta de caráter, o homem corre para refugiar-se em uma doutrina, a partir do instante em que o crime é racionalizado, ele prolifera como a própria razão, assumindo todas as figuras do silogismo. Ele, que era solitário como o grito, ei-lo universal como a ciência. Ontem julgado, hoje faz a lei."
"(...) No momento em que o crime se enfeita com os despojos da inocência, por uma curiosa inversão peculiar ao nosso tempo, a própria inocência é chamada a justificar-se."
("O Homem Revoltado", introdução, 1951.)
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