18.6.03

UMA PAISAGEM DE CENTAUROS

Às vezes penso que a principal razão para o tropicalismo de Baiano Meloso & comparsas ter crescido firme e forte como erva daninha é o fato de sermos um país capaz de dissolver todas as contradições em Carnaval, batuque e borogodó generalizados. Por exemplo, aqui circulam à vontade, sem ser objeto de estudo da ciência, seres simultaneamente "anarcocapitalistas" e ultracatólicos. Muito mais comuns são criaturas que ostentam cabeças cristãs sobre quatro patas marxistas ou o torso do doutor Sigmund unido às ancas do velho Karl. Esse segundo ser mitológico, no estrangeiro, seria incompreensível para quem tivesse lido mais que as orelhas de "O Mal-Estar na Civilização" (exceto para os surrealistas, que, como sabemos, eram todos analfabetos). Aqui, passa batido. Mas confesso que, para mim, essa profusão de centauros dá um colorido todo especial à paisagem. É delicioso viver num lugar em que o axioma "uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa" não vigora. No Brasil, uma coisa pode ser tudo, menos ela mesma. E futebol é bola na rede.