14.3.02

TORCE, RETORCE, PROCURO, MAS NÃO VEJO...

Houve um período, no início dos anos 60, em que os jazzistas pareciam especialmente interessados em usar músicas "para crianças" nas suas improvisações. Quase simultaneamente, Miles Davis gravava o tema da Branca de Neve ("Someday My Prince Will Come"), o pianista Bill Evans incluía em seus shows "Alice in Wonderland" e John Coltrane fazia sucesso com "My Favorite Things", do musical "The Sound of Music" -na época, ainda não transformado no filme "A Noviça Rebelde".

Claro que a transformação dessas músicas era, muitas vezes, radical. Coltrane gravaria, alguns anos depois, uma versão "free" de uma das músicas de "Mary Poppins" ("Chim Chim Cheree"), além de tocar, ao vivo, longas e ensurdecedoras "coisas favoritas" -sem nenhum traço da melodia original.

Mas isso não desmente o fato de que elas eram, sim, musicalmente interessantes. E seu uso pela música dita "séria" é, na verdade, uma tradição que remonta aos clássicos, com seu aproveitamento de temas folclóricos. Até Mahler usou o "Frères Jacques" para compor o sombrio (e bota sombrio nisso) terceiro movimento de sua primeira sinfonia ("Titã").

Tudo isso para dizer que não devemos desprezar o Gilliard quando ele canta a "Festa dos Insetos". Um dia, algum novo Mahler descobrirá essa maravilha.