4.8.04

Exercícios de estilo (3)

Sim, o cãozinho de três pernas está de volta. Ele é brasileiro e não desiste nunca. Fará xixi no poste ainda que tenha de cair mil vezes.

* Lewis Carroll

"Alice estava andando pelo bosque e dizendo a si mesma: 'Como seria bom transformar certas crianças em porquinhos! É verdade que muitas delas não precisam. Talvez seja melhor transformar alguns porquinhos em crianças. Sim, definitivamente'. De repente estacou, surpreendida, ao ver o Cachorro Perneta Sorridente de Cheshire no alto de um galho de árvore, sorrindo e fazendo xixi para o alto. Achou que ele parecia afável, mas, como não queria se molhar, sentiu que devia tratá-lo com respeito e à distância.

- Cachorrinho Perneta de Cheshire -começou a dizer timidamente, sem saber se ele gostaria do tratamento; mas o cão apenas abriu um pouco mais o sorriso. 'Ótimo, parece que gostou!', pensou ela, e prosseguiu: - O que você está fazendo em cima dessa árvore? Cães não sobem em árvores. Muito menos cachorros pernetas.

- Como não? Por acaso eu não estou aqui? -disse o Cachorro, sem parar de sorrir e de fazer xixi para o alto.

- Mas isso não faz sentido! -replicou Alice, já irritada. - Se você fosse um cachorro de verdade, cairia ao levantar a perna. E você não pode fazer xixi do alto da árvore. Vai molhar as pessoas.

- Eu sou um Falso Cachorro Perneta -respondeu o bicho, sempre sorrindo. - Se você se comportar direitinho, posso cantar a Canção do Falso Cachorro Perneta Sorridente. Quanto à chuva, basta que você vá à casa do Chapeleiro, naquela direção -e levantava a segunda pata-, ou à da Lebre de Março, naquela outra -agora o cão tinha as três patinhas no ar. - Eles têm uma coleção de guarda-chuvas: milhares, de todas as cores, formatos e sabores. Tomam chá num guarda-chuva, dormem em outro, usam um terceiro para passear pelo lago e um quarto para escrever suas cartas. Peça-lhes um guarda-chuva emprestado. Ou pegue um. Não darão pela falta.

- Dormir num guarda-chuva é coisa de gente maluca -disse Alice, e imediatamente se arrependeu do que tinha dito.

- Sem dúvida -ponderou o cachorro. - Todos aqui somos loucos. Eu sou louco. Você é louca.

- Como sabe que eu sou louca? -indagou Alice.

- Deve ser. Senão, não estaria aqui conversando com um cachorro perneta sorridente na hora em que ele satisfaz suas necessidades. Menina mais inconveniente. Seus pais não lhe deram modos?

Furiosa, Alice pôs-se a balançar o galho da árvore, para tentar fazer o cachorro cair. No mesmo instante ele se esvaiu no ar: apenas o sorriso permaneceu suspenso por algum tempo e, depois, também sumiu. Satisfeita, Alice tomou o caminho da casa do Chapeleiro. No meio dele, porém, foi apanhada pela chuva."