10.5.05

A poesia brasileira cabe num sofá

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Sei que a reprodução da foto, de 1962, não é muito boa, mas ela prova que toda a história da poesia brasileira no século 20 pode ser espremida no mesmo sofá. Observem: Bandeira dirige-se a algum interlocutor fora da foto, talvez fora do mundo, dormindo profundamente. Drummond faz sua habitual imitação de pedra. Vinícius, malandramente, esgueira seu braço direito por trás de Cecília. E o larguíssimo sorriso de Cecília, ensanduichada por três grandes poetas -ah, como eram grandes!-, diz muito mais coisas do que toda a obra pornográfica de Hilda Hilst (Cecília, I'm down on my knees). Faltou só João Cabral, provavelmente por estar com enxaqueca e não suportar flashes fotográficos. Dizem que havia uma festinha de criança no mesmo ambiente, e um dos garotos perguntou a um adulto quem eram aqueles tios desconhecidos no sofá do fundo. "É a poesia brasileira", foi a resposta. "Ah, tá", disse o menino, antes de cair de boca nos brigadeiros da mesa ao lado.

(Adendo com a colaboração dos leitores: Murilo Mendes, de guarda-chuva aberto, está ouvindo Mozart embaixo do sofá. Atrás do sofá estão Jorge de Lima e a Negra Fulô. Adélia Prado está na cozinha, assando pão de queijo. Ferreira Gullar preferiu ficar na rua, distribuindo panfletos do CPC. Oswald de Andrade, que vestia só tanga, foi barrado na entrada e mordeu a mão do segurança. Num outro canto, os concretinos tentam, com muita dificuldade, resolver as cruzadinhas do Coquetel; um deles, talvez Haroldão, irá ao orelhão da esquina e ligará para Ezra Pound pedindo ajuda.)