25.5.05

De Sartre a Timóteo em 30 segundos

O Flagelo de Sodoma observou que Nelson Rodrigues conseguia descrever em algumas linhas aquilo que Ortega y Gasset precisou de um livro inteiro para explicar -a explosão triunfal dos idiotas. Contudo Ortegón, por sua vez, em apenas um parágrafo de "A Rebelião das Massas" -ao qual ele nem deu muita importância-, antecipou e resumiu o existencialismo. Vejam: "Circunstância e decisão são os dois elementos essenciais de que se compõe a vida. A circunstância -as possibilidades- é o que nos é dado e imposto em nossa vida. Isso constitui o que chamamos o mundo. A vida não escolhe seu mundo, mas viver é encontrar-se, de início, num mundo determinado que não pode ser trocado: neste de agora. Nosso mundo é a dimensão de fatalidade que integra nossa vida. Mas essa fatalidade vital não é semelhante à mecânica. Não somos disparados sobre a existência como a bala de um fuzil, cuja trajetória já está absolutamente determinada. A fatalidade com que nos deparamos ao entrar neste mundo (...) consiste no contrário. Em vez de nos ser imposta uma trajetória, nos são impostas várias, o que conseqüentemente nos força... a escolher. (...) Viver é sentir-se fatalmente forçado a exercer a liberdade, a decidir o que vamos ser neste mundo. Não há um momento de descanso para nossa atividade de decisão. Inclusive quando, desesperados, nos abandonamos à sorte, decidimos não decidir".

E a coisa morre aí. Esse trecho é de 1926, bem antes que o anão vesgo (opa, opa, ser vertical e ocularmente prejudicado) enchesse páginas e páginas de prosa não raro abstrusa -sem consideração por aquela cortesia do filósofo, a clareza- com esse negócio de "o homem está condenado a ser livre", vendido, bien sûr, como uma idéia original. Mas, àquela altura, a ascensão flamejante dos idiotas já era um fenômeno consolidado entre leitores e letrados. Muitos anos depois, essa ascensão explica que seres que confundem trailer com thriller ou advertem para a "catequese subliminar" em obras de C.S. Lewis não só sejam considerados alfabetizados como passem por inteligentes. (Já que o espírito do tempo é esse, quero mandar uma mensagem aos pais conscienciosos: não exponham seus filhos pequenos a Agnaldo Timóteo cantando "A Galeria do Amor". Eles não verão a hora de chegar à puberdade para sair por aí dando a bunda, votando no Maluf ou as duas coisas juntas.)