31.3.05
No verão, engaje-se no plebiscito mais importante do país. Vote em Mário Gomes para garoto-propaganda de Cenoura & Bronze.
30.3.05
De Pseudo-Dionísios e Paracelsos
Antigamente, os nomes de místicos eram cool as hell. Ou vão dizer que vocês não acham o máximo alguém, como o presumível autor da "Hierarquia Celeste", ser conhecido como Pseudo-Dionísio? Diz-se que, à semelhança dos atuais concursos para escolher o melhor sósia de Elvis, na Idade Média havia torneios para descobrir o verdadeiro Pseudo-Dionísio: ganhava quem demonstrasse ter na ponta da língua tratados completos sobre serafins, querubins, virtudes, dominações e potestades. Outro dos meus preferidos é Teophrastus Bombastus von Hohenheim, alquimista suíço do século 16, por alcunha o Paracelso: assim como há médicos e paramédicos hoje, naquele tempo havia Celsos e Paracelsos (e até, dizem, alguns Excelsos). Houve ainda, no século 17, o jesuíta alemão Athanasius Kircher, aquele da lanterna mágica: imaginem que torrente de votos um Enéas não receberia se pudesse gritar "meu nome é Athanasius Kircher!". Seria muito mais convincente.
Todos esses nomes trazem em si ressonâncias místicas imediatas e são, portanto, confiáveis: por isso a revista "Placar" que eu lia quando moleque, no fim dos anos 70, trazia anúncios da "corrente talismânica de Paracelso". Nesta época degenerada, porém, qualquer Zilda Vaporetto se arroga esse tipo de credibilidade. Há quem ache isso bom. Só concordarei quando conseguir vender milhões de unidades da corrente talismânica de Ruy Goiaba.
Todos esses nomes trazem em si ressonâncias místicas imediatas e são, portanto, confiáveis: por isso a revista "Placar" que eu lia quando moleque, no fim dos anos 70, trazia anúncios da "corrente talismânica de Paracelso". Nesta época degenerada, porém, qualquer Zilda Vaporetto se arroga esse tipo de credibilidade. Há quem ache isso bom. Só concordarei quando conseguir vender milhões de unidades da corrente talismânica de Ruy Goiaba.
29.3.05
O tenista que saiu do armário
Foi-se o tempo em que eu me recusava a escrever textos sobre acontecimentos: hoje, acho fantástico quando a própria realidade se encarrega de produzir uma piada. A gente só tem o trabalho de recortar e colar no blogue. Por exemplo, essa história do tenista croata que foi abrir seu armário -presumivelmente para pegar sua raquete- e encontrou nele um colega francês, pelado em pêlo. O penista argumentou que se metera lá para captar a "energia positiva" do rival, o qual ocupa posição melhor no ranking. Sei.
A história ficaria menos absurda num roteiro de pornochanchada (marido corno abre o armário da mulé dadivosa e vê Nuno Leal Maia ou Ewerton de Castro em seu birthday suit. "Seu feladaputa, que é que cê tá fazendo aí?" "Né nada disso que cê tá pensando. É que eu sei que você é o maior garanhão, sacumé? Aí, entrei aqui pra captar um pouco da sua energia positiva." "Aaaah, bom."), mas é verdade verdadeira. Só sei que, se a moda pega, vai ter muita gente com medo de abrir o armário do escritório e achar lá o seu Osório, do almoxarifado, naquela posição napoleônica. E, se eu fosse o tenista croata, cuidaria de desinfetar o cabo da raquete.
A história ficaria menos absurda num roteiro de pornochanchada (marido corno abre o armário da mulé dadivosa e vê Nuno Leal Maia ou Ewerton de Castro em seu birthday suit. "Seu feladaputa, que é que cê tá fazendo aí?" "Né nada disso que cê tá pensando. É que eu sei que você é o maior garanhão, sacumé? Aí, entrei aqui pra captar um pouco da sua energia positiva." "Aaaah, bom."), mas é verdade verdadeira. Só sei que, se a moda pega, vai ter muita gente com medo de abrir o armário do escritório e achar lá o seu Osório, do almoxarifado, naquela posição napoleônica. E, se eu fosse o tenista croata, cuidaria de desinfetar o cabo da raquete.
28.3.05
Existe macumba lacaniana?
Claro que sim, mizifio. Se você passar por uma encruzilhada e vir um despacho cheio de Objetos A em lugar do frango e da farofa habituais, saiba que se trata de um trabalho lacaniano (e, claro, não se esqueça de dizer "saravá pas", com sotaque francês, e se benzer). Há terreiros lacanianos, nos quais às vezes acontece de os rituais serem interrompidos abruptamente pelo pai-de-santo. E quem vai lá tem de estar preparado para o instante em que o Grande Outro baixa -geralmente, por trás. Ah, como era grande.
(Mais informações aqui, na Cabana do Pai Lacan.)
(Mais informações aqui, na Cabana do Pai Lacan.)
27.3.05
Uma história de Páscoa
O herege gramatical comia cocrete de carne na Sexta-Feira Santa.
(Ele seria excomungado por Napoleão Mendes de Almeida, mas Pasquale acha que tudo bem. A igreja ficou mais pogressista.)
(Ele seria excomungado por Napoleão Mendes de Almeida, mas Pasquale acha que tudo bem. A igreja ficou mais pogressista.)
25.3.05
Contrate Ruy Goiaba para seu casamento
Álbuns e vídeos de casamento estão entre as maiores fontes de inspiração do puragoiaba, embora sejam, ao mesmo tempo, humilhantes. Sabe lá o que é constatar que, por mais que você se esforce, jamais conseguirá atingir aquele nível transcendental de cafonice? Há, por exemplo, o casal que contrata uma dupla de estatuístas para sua cerimônia e posa, braços entrelaçados e taças de champanhe na mão, ao lado dos Neros inteiramente pintados de cor-de-cobre, da toga à coroa de louros. Há o vídeo que mostra a transformação de outro casal, em plena valsa, na Bela e na Fera do desenho animado. Há, ainda, a promoter que oferece uma festa com malabaristas e engolidores de fogo, mas não explica se o preço inclui as roupas de palhaço para os noivos. E por aí vai.
Confesso que estou louco para entrar nesse mercado. E já tenho algumas idéias interessantes. Todo casal que fizer questão de se casar ao som de "Assim Falou Zaratustra" receberá de grátis um lindo vídeo em que a noiva, no instante de jogar o buquê, se transformará, pelas artes da fusão cinematográfica, no macaco lançador de osso de "2001". E o instante em que os amigos do noivo cortam sua gravata será sutilmente intercalado com algumas cenas de "O Império dos Sentidos". Vai ficar bem bonito.
Confesso que estou louco para entrar nesse mercado. E já tenho algumas idéias interessantes. Todo casal que fizer questão de se casar ao som de "Assim Falou Zaratustra" receberá de grátis um lindo vídeo em que a noiva, no instante de jogar o buquê, se transformará, pelas artes da fusão cinematográfica, no macaco lançador de osso de "2001". E o instante em que os amigos do noivo cortam sua gravata será sutilmente intercalado com algumas cenas de "O Império dos Sentidos". Vai ficar bem bonito.
24.3.05
Post roubado, mas com crédito
Cacau Marx. Faz seu leite com mais-valia.
(A idéia é do Dante, mas ele não quis postar. Roubei para mim: não tenho superego e não resisto a um ótimo trocadilho péssimo.)
(A idéia é do Dante, mas ele não quis postar. Roubei para mim: não tenho superego e não resisto a um ótimo trocadilho péssimo.)
23.3.05
Troque seu bichano por uma criança pobre
A esta altura, os leitores já devem saber que o verdadeiro teste da farinha para fazer parte dos Wunderblogs é gostar de gatos. Também eu os aprecio deveras, como ingredientes indispensáveis do churrasquinho grego de cada dia (refeição compreta, incluindo suco com doença de Chagas ou leptospirose, à sua escolha, por R$ 1,30 aqui no centro de São Paulo). Penso até em criar felinos para o abate -que é, vocês convirão comigo, um destino muito menos horripilante do que virar musical do Andrew Lloyd Webber.
Almas sensíveis certamente perguntarão: por que não destinar a uma criança pobre o dinheiro gasto com esses gatos, bando de burgueses viadinhos? O chato é que, se isso acontecesse, blogueiros encheriam suas páginas com fotos de crianças pobres muito fofinhas e cute-cute, multiplicando por mil o número de Sebastiões Salgados. Cruz-credo, deusmelivre, tesconjuro. E criá-las para o abate está inteiramente fora de cogitação: ao contrário do que dizia Jonathan Swift, o investimento não compensa. Carne de criança pobre é magrinha demais para o churrasco grego.
Almas sensíveis certamente perguntarão: por que não destinar a uma criança pobre o dinheiro gasto com esses gatos, bando de burgueses viadinhos? O chato é que, se isso acontecesse, blogueiros encheriam suas páginas com fotos de crianças pobres muito fofinhas e cute-cute, multiplicando por mil o número de Sebastiões Salgados. Cruz-credo, deusmelivre, tesconjuro. E criá-las para o abate está inteiramente fora de cogitação: ao contrário do que dizia Jonathan Swift, o investimento não compensa. Carne de criança pobre é magrinha demais para o churrasco grego.
22.3.05
Abençoá por Dê e boni por naturê
Que coisa maravilhosa é viver num lugar em que as pessoas tomam caldo de cana e morrem de doença de Chagas. Aguardemos para muito breve o chocolate que dá Aids e a rapadura cancerígena.
21.3.05
Diálogos com o crítico retardado (3)
- Crítico retardado, vamos falar de literatura. Você é um daqueles dez feladaputa que lê livro?
- Bakhtin, Propp, Chomsky, Saussure.
- Certo, já vi que você conhece esses teóricos. Mas do que gosta? Romances, contos, poemas, teatro?
- Kristeva, Greimas, Auerbach, Jakobson, Cassirer, Barthes, Lacan, Derrida.
- Dá para me escutar? Quero saber sua opinião sobre livros de verdade, não sobre essa gente-que-escreve-sobre-livros.
- Carnavalização! Mímese! Peripécia! Idioleto! Lexema! Sema, semema, semantema! Ortolinguagem! Corte epistemológico, corte dialógico! Sistemas genitivamente afins! Espaço heterotópico! Signo cinésico! Lingüística transfrástica!
- Acudam! Ele está descontrolado!
- Glossemática! Movimento transformacionalista! Estrutura exo-semântica da linguagem musical! Principalidade da língua no conjunto dos sistemas semiológicos! Pound! Haroldão, Augustão, Pugnetari! Lemingue! Bomvizinho! (Apoplético, bate com os punhos cerrados sobre a mesa.) VIS-NI-QUE! VIS-NI-QUE!
(*Enfim, chegam os enfermeiros com a camisa-de-força*)
(D'après Drumão e Soares Silva.)
- Bakhtin, Propp, Chomsky, Saussure.
- Certo, já vi que você conhece esses teóricos. Mas do que gosta? Romances, contos, poemas, teatro?
- Kristeva, Greimas, Auerbach, Jakobson, Cassirer, Barthes, Lacan, Derrida.
- Dá para me escutar? Quero saber sua opinião sobre livros de verdade, não sobre essa gente-que-escreve-sobre-livros.
- Carnavalização! Mímese! Peripécia! Idioleto! Lexema! Sema, semema, semantema! Ortolinguagem! Corte epistemológico, corte dialógico! Sistemas genitivamente afins! Espaço heterotópico! Signo cinésico! Lingüística transfrástica!
- Acudam! Ele está descontrolado!
- Glossemática! Movimento transformacionalista! Estrutura exo-semântica da linguagem musical! Principalidade da língua no conjunto dos sistemas semiológicos! Pound! Haroldão, Augustão, Pugnetari! Lemingue! Bomvizinho! (Apoplético, bate com os punhos cerrados sobre a mesa.) VIS-NI-QUE! VIS-NI-QUE!
(*Enfim, chegam os enfermeiros com a camisa-de-força*)
(D'après Drumão e Soares Silva.)
19.3.05
Diálogos com o crítico retardado (2)
- Crítico retardado, fale um pouco dos seus gostos musicais.
- A música mudou minha vida. Hoje de manhã, por exemplo, eu estava ouvindo os Libertines, a melhor banda de todos os tempos, e eles mudaram minha vida. No começo da tarde, fiquei escutando Franz Ferdinand, outra melhor banda de todos os tempos, e eles também mudaram a minha vida. O problema é que agora são 15h e eu ainda não consegui entrar no site da NME para saber qual é a nova banda seminal, melhor de todos os tempos, que vai mudar minha vida. (Começa a tremer.) Síndrome de abstinência, olhe só.
- Se não me engano, uns dez anos atrás, você achava que o Supergrass era a salvação do roque. Lembra deles?
- O passado não existe. E, se existir, não interessa. Próxima.
- Para você, "música" e "roque" são a mesma coisa? Nem suspeita que possam existir outros tipos de música, como a clássica?
- Ah, ninguém ouve esse negócio aí. Mozart, Pavarotti, são todos uns caras que morreram há 500 anos. É música de velho. Só gente metida a inteligente, erudita etc. finge que gosta dessas coisas.
- Ninguém pode gostar de verdade de Bach, então?
- Nenhum dos meus amigos gosta, ora. Você conhece alguém? Eu só escuto a Cultura FM quando vou ao dentista, ha-ha-ha.
- Você e seu dentista deveriam trocar de profissão.
- Como assim? Eu não fiz odonto. Não entendi.
- (*suspiro*)
- A música mudou minha vida. Hoje de manhã, por exemplo, eu estava ouvindo os Libertines, a melhor banda de todos os tempos, e eles mudaram minha vida. No começo da tarde, fiquei escutando Franz Ferdinand, outra melhor banda de todos os tempos, e eles também mudaram a minha vida. O problema é que agora são 15h e eu ainda não consegui entrar no site da NME para saber qual é a nova banda seminal, melhor de todos os tempos, que vai mudar minha vida. (Começa a tremer.) Síndrome de abstinência, olhe só.
- Se não me engano, uns dez anos atrás, você achava que o Supergrass era a salvação do roque. Lembra deles?
- O passado não existe. E, se existir, não interessa. Próxima.
- Para você, "música" e "roque" são a mesma coisa? Nem suspeita que possam existir outros tipos de música, como a clássica?
- Ah, ninguém ouve esse negócio aí. Mozart, Pavarotti, são todos uns caras que morreram há 500 anos. É música de velho. Só gente metida a inteligente, erudita etc. finge que gosta dessas coisas.
- Ninguém pode gostar de verdade de Bach, então?
- Nenhum dos meus amigos gosta, ora. Você conhece alguém? Eu só escuto a Cultura FM quando vou ao dentista, ha-ha-ha.
- Você e seu dentista deveriam trocar de profissão.
- Como assim? Eu não fiz odonto. Não entendi.
- (*suspiro*)
18.3.05
Diálogos com o crítico retardado
- Crítico retardado, você gostou do "Othello" de Orson Welles?
- Ah, não gostei, não. Filme horrível, sobretudo aquele Iago: sujeitinho pérfido, asqueroso, dá vontade de esganar. Além disso, a coisa toda tem cara de teatro filmado. Achei péssimo mesmo.
- Bom, o Iago é de fato um dos piores vilões do Shakespeare. Que era, aliás, dramaturgo, não sei se você sabe disso.
- Bem que eu desconfiava. Viu como eu sempre acerto?
- (*suspiro*)
- Ah, não gostei, não. Filme horrível, sobretudo aquele Iago: sujeitinho pérfido, asqueroso, dá vontade de esganar. Além disso, a coisa toda tem cara de teatro filmado. Achei péssimo mesmo.
- Bom, o Iago é de fato um dos piores vilões do Shakespeare. Que era, aliás, dramaturgo, não sei se você sabe disso.
- Bem que eu desconfiava. Viu como eu sempre acerto?
- (*suspiro*)
17.3.05
When you wish upon a star
Quando viu a estrela cadente, quis pedir para voltar a viver num país em que os compositores de música popular usassem palavras como "sestrosa" e "buliçoso". Desistiu antes do pedido porque se lembrou de que a "sestrosa" e o "buliçoso" não voltariam sem ser acompanhados pela varíola e pela tuberculose; além disso, certamente a tal estrela era mero resquício dos fogos usados pelos traficantes para avisar sobre a chegada da polícia. Pensou em apontar a benga para as Três Marias, para ver se nascia mesmo uma verruga, mas achou mais fácil e rápido, sweet fulfillment of his secret longing, enfiar a cabeça no forno. Enquanto isso, uma partícula mineral entrava na atmosfera da Terra e caía, incandescente, a cerca de 300 metros da cozinha repleta de gás.
16.3.05
Uma tese para o próximo milênio
"Festa no Apê", a obra-prima de Latino, é uma homenagem ao tchiatro brasileiro. Qualquer ouvinte perspicaz já terá percebido que o verso "vai rolar bundalelê" é uma alusão a Gerald Thomas e o trecho "no meu quarto tem gente até fazendo orgia" refere-se às encenações dionysíacas do Zé Celso. Outras referências são mais sutis: "vou zoar o mulherio e a chapa vai esquentar" é uma frase que, por sua beleza auditiva, poderia estar em qualquer texto do Miguel Falabella. Latino ainda tentou disfarçar, porque lá em Maria da Graça o pessoal olha meio de lado para esse povo-esquisito-que-faz-tchiatro. Em vão: sua música, como quase toda a produção cultural da Botocúndia, é a cara da bunda do Gerald.
15.3.05
Crueldade intolerável
Antes mesmo de começar, a nova novela das oitcho -que, como sabeis, há tempos vai ao ar depois das nove- já provoca acaloradas discussões por tratar, sem rodeios, de rodeios. Algumas almas sensíveis e compassivas, revoltadas com o assunto, deixaram scraps no perfil orkútico de Gloria Perez que mostram com eloqüência quanta beleza lhes perpassa o espírito. Defensores de "causas nobres" nos quais você não enxerga humanidade nem debaixo dos microscópios do Adolfo Lutz: nada de novo sob o sol.
De minha parte, acho os rodeios um negócio übercafona. Não seria eu, claro, a ter alguma coisa contra a cafonice: parafraseando o tarado-de-pijama, eu a compreendo e a recebo como uma graça de Deus. E o brega aqui é tão disseminado, tão indissociavelmente parte da paisagem que protestar contra ele é vão. Crueldade intolerável mesmo, in my humble opinion, é Gloria Perez submeter os telespectadores a seis ou mais meses de contato visual diário, acidental ou não, com Eri Johnson e sua pinta. E ninguém pede socorro à polícia estética nem protesta contra a evidente violação à Convenção de Genebra. Brasileiro é tudo bundão mesmo.
De minha parte, acho os rodeios um negócio übercafona. Não seria eu, claro, a ter alguma coisa contra a cafonice: parafraseando o tarado-de-pijama, eu a compreendo e a recebo como uma graça de Deus. E o brega aqui é tão disseminado, tão indissociavelmente parte da paisagem que protestar contra ele é vão. Crueldade intolerável mesmo, in my humble opinion, é Gloria Perez submeter os telespectadores a seis ou mais meses de contato visual diário, acidental ou não, com Eri Johnson e sua pinta. E ninguém pede socorro à polícia estética nem protesta contra a evidente violação à Convenção de Genebra. Brasileiro é tudo bundão mesmo.
14.3.05
Renato Cartésio reloaded
A falta de senso de ridículo é a coisa mais bem distribuída do mundo. (Mas, em alguns, sempre fica um resquício. Coitados.)
12.3.05
Vá ao cinema, mas não me chame
O post é extemporâneo, mas vamos lá. A única coisa realmente divertida do Oscar é o pancake no rosto do Rubens Ewald Filho, mas admito que, sempre que a cerimônia se aproxima, corro para ver os indicados a melhor filme de 70 anos atrás. Ótima ocasião para fugir dos filmecos-que-todo-mundo-está-vendo e rever aquele DVD de "It Happened One Night", que garfou os principais homenzinhos dourados de 1935 -filme, ator (Clark Gable), atriz (Claudette Colbert) e diretor (Frank Capra, velho batuta). É bom ser inatual, usar o bigodinho de Mr. Gable, mesmo imaginário, e dizer frankly, my dear, I don't give a damn a tudo isso que está aí. Contemporaneidade é palavra feia e, cá entre nós, meio gay.
Mas também já fui brasileiro, moreno como vocês: ponteei viola, guiei forde, até discuti em mesinha de bar filmes que não recendiam a naftalina. E ai de mim. Hoje, quando me dizem que Mike Nichols voltou a fazer filmes decentes, acho difícil que o sujeito que dirigiu essa coisa inominável que é "Uma Secretária de Futuro" fique de quatro e consiga se levantar depois. (Claro que, para muitos diretores, permanecer de quatro não é problema. Pasolini que o diga, bi. Mas isso não vem ao caso.) Na dúvida, opto por não ver; prefiro investir a grana do ingresso em cappuccinos.
Em suma, a experiência me diz que 30 anos depois de um filme ser lançado -tempo que levei, por exemplo, para ver "F for Fake", do Fat Man- é um prazo razoável para ir vê-lo. Quem sabe eu vá ver "Closer" em 2035, se o cinema não tiver morrido até lá. Há muitos cineastas tentando matá-lo: são teimosos, um dia vão conseguir.
Mas também já fui brasileiro, moreno como vocês: ponteei viola, guiei forde, até discuti em mesinha de bar filmes que não recendiam a naftalina. E ai de mim. Hoje, quando me dizem que Mike Nichols voltou a fazer filmes decentes, acho difícil que o sujeito que dirigiu essa coisa inominável que é "Uma Secretária de Futuro" fique de quatro e consiga se levantar depois. (Claro que, para muitos diretores, permanecer de quatro não é problema. Pasolini que o diga, bi. Mas isso não vem ao caso.) Na dúvida, opto por não ver; prefiro investir a grana do ingresso em cappuccinos.
Em suma, a experiência me diz que 30 anos depois de um filme ser lançado -tempo que levei, por exemplo, para ver "F for Fake", do Fat Man- é um prazo razoável para ir vê-lo. Quem sabe eu vá ver "Closer" em 2035, se o cinema não tiver morrido até lá. Há muitos cineastas tentando matá-lo: são teimosos, um dia vão conseguir.
11.3.05
Pela volta dos milicos ao poder
Começo a duvidar da viabilidade do despotismo esclarecido de Clóvis Bornay como regime político da Botocúndia. Bornay merece, no mínimo, um cenário com alegorias e adereços dignos da corte de Luís 14, mas isso seria dispendioso demais. Precisamos de austeridade, pulso firme -isto é, sem desmunhecações-, combate à corrupção e respeito à hierarquia. O único governo capaz de satisfazer plenamente todos esses requisitos é uma junta militar comandada pelo Sargento Pincel. Afinal, quem precisa de democracia quando se tem um hino tão legal quanto o que segue?
We're Sgt. Pincel's Lonely Hearts Club Band
We hope you will enjoy the show
Sgt. Pincel's Lonely Hearts Club Band
Sit back and let the evening go
Jorge Lafond fará falta como chefe da Casa Militar, mas paciência.
We're Sgt. Pincel's Lonely Hearts Club Band
We hope you will enjoy the show
Sgt. Pincel's Lonely Hearts Club Band
Sit back and let the evening go
Jorge Lafond fará falta como chefe da Casa Militar, mas paciência.
10.3.05
Por que não existem gênios fanhos
Nos fanhos, devido à obstrução das vias nasais, o espírito, que os gregos chamavam de pneuma, não sopra onde quer. Nem tem por onde; é uma simples questão de otorrinolaringologia aplicada à metafísica. Desconfie, portanto, sempre que alguém vier lhe dizer que Bob Dylan, Belchior ou o Grande Corneador da MPB são "gênios": nem Aristóteles nem o seu otorrino assinariam embaixo.
(Post com a colaboração de Pedro Sette Câmara, FDR, Mercuccio, Dante e uma pá de gente aí. Mais ou menos como aquelas músicas dos Tetães com um minuto e meio e oito autores. Aa-uu, aa-uu.)
(Post com a colaboração de Pedro Sette Câmara, FDR, Mercuccio, Dante e uma pá de gente aí. Mais ou menos como aquelas músicas dos Tetães com um minuto e meio e oito autores. Aa-uu, aa-uu.)
9.3.05
Piada velhíssima revisitada, com moral
Dizem que o sujeito financeiramente prejudicado foi à casa de tolerância e passou um longo tempo olhando o cardápio do lugar (longo parêntese digressivo: é mais divertido escrever casa de tolerância, que parece um clichê extraído das histórias do José Cândido de Carvalho, do que puteiro. Desdobro a digressão: foi o Catarro Verde que contou aquela história atribuída ao José Dumont? O ator foi fazer um filme no chamado Brasil profundo e conheceu uma, ahn, casa de tolerância diante da qual se lia esta tabuleta: "Infelizmente não trabalhamos com cu. A Gerência". Fim do parêntese). Enfim, o freguês estava olhando o cardápio e quase todas as opções eram muito caras -a única despesa com que ele podia arcar era "sacanagem", que custava doirreal. Quis saber onde era o lugar da sacanagem; passaram-lhe as coordenadas. Era preciso subir e descer infinitos lances de escada, rastejar por desvãos, entrar em buracos, escalar paredes, pisar em brasas, passar por um corredor polonês etc. etc. Quando, quatro horas e vinte e três minutos depois, o sujeito finalmente chegava à porta em que estava escrito "sacanagem", abria e dava de cara com a rua.
Sim, admito que a piada é fraca, mas talvez tenha ficado melhor na versão remix. No final, em vez de o protagonista abrir a porta da rua, ele abre a de uma pequena sala. Dentro, um analista lacaniano refestelado na sua poltrona, fumando Gitanes. "Desculpe, sacanagem é aqui?", pergunta. O analista olha por cima dos óculos e responde: "Sim. E seu tempo acabou. Você me deve 500 reais".
Moral da piada: lacanagem é a verdadeira sacanagem. Com PhD.
Sim, admito que a piada é fraca, mas talvez tenha ficado melhor na versão remix. No final, em vez de o protagonista abrir a porta da rua, ele abre a de uma pequena sala. Dentro, um analista lacaniano refestelado na sua poltrona, fumando Gitanes. "Desculpe, sacanagem é aqui?", pergunta. O analista olha por cima dos óculos e responde: "Sim. E seu tempo acabou. Você me deve 500 reais".
Moral da piada: lacanagem é a verdadeira sacanagem. Com PhD.
8.3.05
There's a shitstorm comin' down
No fim dá merda. É como os otimistas explicam o duplo sentido da palavra "escatologia" nos dicionários. (Os pessimistas acham que já deu. Quando são bonzinhos, procuram não fazer marola. Em vão.)
7.3.05
Um continente sem solucionática
A América Latina não se dá por satisfeita em exercitar sua propensão ao ridículo apenas na literatura, no cinema ou nas eleições presidenciais -não, até no futebol, ou sobretudo nele, temos de ser cucarachas. Quem batiza um time como The Strongest, por exemplo, o mínimo que deveria fazer é dar um tiro no coco em caso de empate. Ou, na derrota, obrigar o técnico e os 11 jogadores a um haraquiri coletivo. Mas eles já começaram errado sendo bolivianos, então fica por isso mesmo. Haverá talvez quem relembre o ilustre precedente da Invencível Armada espanhola, aquela que foi afundada pelos ingleses. Faz sentido.
Na Argentina, por sua vez, há os Newell's Old Boys, aquela equipe que volta e meia é confundida com os New Kids on the Block. Claro que quem já votou num Menem, com costeletas e tudo, não se importa de torcer por um time com nome de boy band. E por aí vai. Sei que, aqui no Bananão, sou um roto falando dos rasgados -mas ao menos produzimos Dario, inventor do dadaísmo e mais importante contribuição do continente ao pensamento filosófico ocidental. É ou não é para ficar orgulhoso, torcida brasileira?
Na Argentina, por sua vez, há os Newell's Old Boys, aquela equipe que volta e meia é confundida com os New Kids on the Block. Claro que quem já votou num Menem, com costeletas e tudo, não se importa de torcer por um time com nome de boy band. E por aí vai. Sei que, aqui no Bananão, sou um roto falando dos rasgados -mas ao menos produzimos Dario, inventor do dadaísmo e mais importante contribuição do continente ao pensamento filosófico ocidental. É ou não é para ficar orgulhoso, torcida brasileira?
4.3.05
O que os jornais nos ensinam
Severino, o deputado transgênico, desistiu de reajustar os salários das células-tronco e declarou que os embriões são uns idiotas. O Corinthians saiu da moratória e vai construir uma passarela ligando o Parque São Jorge à Argentina. A Vigilância Sanitária informa que o crescimento do PIB brasileiro é impróprio para o consumo. Na França, 66 pessoas são julgadas por gostar de Moby. E os índios dizem ter vergonha da política de cotas para bacalhaus.
3.3.05
Supergênios, ativar!
SUPERGÊNIOS, ATIVAR!
- Forma de um pêlo do saco de Simón Bolívar!
- Forma de um barril de cachaça!
- Forma de um Maradona de gelo!
(A foto é de Sérgio Lima/Folha Imagem.)
- Forma de um pêlo do saco de Simón Bolívar!
- Forma de um barril de cachaça!
- Forma de um Maradona de gelo!
(A foto é de Sérgio Lima/Folha Imagem.)
2.3.05
Zagallo é meu pastor e pasto não me faltará
Gosto de "Ruy Goiaba" porque tem 13 letras, assim como "empate é bom resultado" e "vocês vão ter que me engolir". Ah, nada disso tem 13 letras? Desculpem: depois que me naturalizei índio, só consigo contar um, dois, três e "muitos" -expressão prática que resume todos aqueles números complicados a partir de quatro. Também sou inimputável e balanço a benga sob a tanga. Beware.
1.3.05
Eu quero votar para papa
Oh, Lord, please, don't let me be misunderstood: acho o Karol do balacobaco e estou torcendo para que ele volte a encarar uma feijoada e a bater aquela bolinha com os cardeais todo sábado. Mas o fato é que nós, os 980 milhões de católicos em ação (pra frente, Jesus do meu coração), não piamos na hora de escolher nosso líder. É bonito isso? Se o Jorge Arbusto diz que a democracia tem de ser espalhada como massa de panqueca pelo mundo, por que não também no Vaticano? Sem contar que, a cada 500 anos, um Rodrigo Bórgia vira papa e os fiéis fiéis não podem fazer nada.
Lanço, pois, a campanha pelas eleições diretas para o próximo papa: chega de só homens de saia poderem votar. E já proponho minha lista tríplice de candidatos, para a apreciação dos leitores:
1) Jennifer Connelly
2) Paulo César Peréio
3) Ruy Goiaba, servo do Senhor (quem fizer trocadilhos com "cervo do Senhor" leva um pescotapa virtual).
Sei que minhas chances são remotas, mas argumento que minhas tias carolas ficariam orgulhosas de me ver segurando aquele cajado bonitão (afe). Se você, porém, tem outro candidato favorito às sandálias do pescador, deixe o nome dele nos comentários.
Lanço, pois, a campanha pelas eleições diretas para o próximo papa: chega de só homens de saia poderem votar. E já proponho minha lista tríplice de candidatos, para a apreciação dos leitores:
1) Jennifer Connelly
2) Paulo César Peréio
3) Ruy Goiaba, servo do Senhor (quem fizer trocadilhos com "cervo do Senhor" leva um pescotapa virtual).
Sei que minhas chances são remotas, mas argumento que minhas tias carolas ficariam orgulhosas de me ver segurando aquele cajado bonitão (afe). Se você, porém, tem outro candidato favorito às sandálias do pescador, deixe o nome dele nos comentários.