18.12.01

P.S.

Para aliviar um pouquinho a barra do post anterior:

Mas tudo passa, tudo paaaaaaaassará
E nada fica, nada fiiiiicará
Só se encontra a feli-ci-ida-adeee
Quando se entrega o coraçããão...


Nelson Ned salva. Aleluia, irmãos!


THE PARTY’S OVER NOW

Respeitável público, o puragoiaba vai recolher a sua lona sujinha e esburacada e levantar acampamento por uns tempos. Vocês sabem (ou, se não sabem, supõem): o palhaço sempre tem uma mulher que grita a noite toda e se corta metodicamente com gilete, um filho ou uma filha que come lixo e se prostitui em troca de pedras de crack. Banalíssimo, como todas as atrações circenses que o mundo nos oferece. A distinta platéia nada tem a ver com isso -e, afinal, o palhaço é um profissional, embora precise se entorpecer de vez em quando para exercer o ofício.

Mas pausas são necessárias. É preciso torcer o pano de chão empapado de sangue e verificar se o filho está batendo os dentes e suando mais do que o habitual. Um dia o palhaço volta, como a Luísa Porto do poema do Drummond: ou nunca, ou pode ser, ou ontem. Só uma diferença: não há, decididamente não há, estrelas invisíveis. Nem nenhuma outra: a luz que nos chega delas adverte que já estão mortas há muito tempo.

Deixo abraços para algumas pessoas que, carinhosamente, me citaram ou se corresponderam comigo por e-mail e que eu até agora não havia “linkado”: Vanessa, Fábio, Blaise Dandi, GuiSid, Debis e, last but not least, Sergio Faria. Talvez eu esteja me esquecendo de alguém: se você é um deles, desculpe.

Au revoir, mes amis. Espero, apesar de tudo, que vocês se divirtam com o que ficou aí atrás (isto é, embaixo). Num canto, há um gramofone que ainda funciona e toca discos velhíssimos, inteiramente arranhados. Mas, se vocês escutarem bem, conseguirão ouvir o Noël Coward.

The thrill has gone, to linger on
Would spoil it anyhow
Let’s creep away from the day
For the party’s over now



15.12.01

BREGA'S BANQUET 26

E você, leitor esperto do puragoiaba, dê um chega-pra-lá em quem vier com papo de "Senhor dos Anéis". Mostre aos ignaros quem é o único, o legítimo, o insubstituível senhor dos anéis (um em cada dedo):

Mas chegoooooooou
O Carnavaaaaaaaaal
E ela nãããããããããão
Desfilooooooooooou
E eu choreeei, na avenida eu choreeei
Não pensei que mentia a cabrocha que eu tanto amei


Benito Di Paula e seus "Retalhos de Cetim" estão no panteão. Faça como o Charlie Brown e ande na boa companhia da cafonice benitiana.

BREGA'S BANQUET 25

Já que você quer perder tempo por aqui, seja bem-vindo. Temos churros, vinho Chapinha, pipoca doce e tubaína à la vonté (não, isso não é francês. É apenas brega). Temos, sobretudo, os mais bonitos versos do cancioneiro popular bananoso. Por exemplo, estes dois:

Se o quadradismo dos meus versos
Vai de encontro aos intelectos...


Antônio Carlos e Jocafi, moçada -para vocês que pensavam que a letra desse samba era só "você abusou, tirou partido de mim, abusou", repetida ad infinitum. Bom, é quase isso mesmo.

14.12.01

BREGA'S BANQUET 24

Olho para a chuva que não quer cessar
Nela vejo o meu amor
Esta chuva ingrata que não vai parar
Pra aliviar a minha dor
Eu sei que o meu amor pra muito longe foi
Com a chuva que caiu
Oh, gente! Por favor, pra ela vá contar
Que o meu coração se partiu


Este brega's banquet mata dois coelhos com uma só paulada. Como vocês sabem, "Ritmo da Chuva" foi o maior sucesso do Demétrius. Descobri que essa música acabou de ser regravada por uma das maiores divindades do meu panteão: Perla.

Ainda não ouvi a versão dela, mas, com aquele sotaque paraguaio, deve ter ficado sensacional. E o site da mulher é chiquérrimo; dê uma navegada pelos rios da Babilônia.

CITAÇÕES FICTÍCIAS 5

"Quem gosta de miséria é intelectual. Pobre gosta de luxo."

Você pensava que essa era verdadeira? Se enganou, meu bem. Foi inventada pelo Elio Gaspari, em seus tempos de "Veja", e colocada na boca (ooops) do Joãozinho Trinta.

O princípio é válido, ainda hoje, para a maioria das citações que você lê naquela revista.

RUY GOIABA'S LONELY HEARTS CLUB BAND 4

O nosso amor é tão bonito
Ela finge que me ama
E eu finjo que acredito


Auditório, uma salva de palmas para Nelson Sargento e seu "Falso Amor Sincero"!
RUY GOIABA'S LONELY HEARTS CLUB BAND 3

Alongado no leito, e a noite silenciosa,
Mal eu cansados olhos ao repouso dava
Quando o cruel Amor me agarra p'los cabelos,
Me acorda e manda que em sua honra eu vele.
"Ó escravo meu, me diz, ó tu que a mil amaste,
Sózinho jazes só, ó duro peito, aqui?"
Descalço e seminu, atiro me pra fora,
Pelos caminhos vou sem que caminho encontre.
E sigo sempre, e paro, e no parar hesito
Entre a vergonha de ir e o tédio de voltar.
Calam-se humanas vozes e da rua os ruídos,
Ave nenhuma canta, sequer ladram cães.
De tudo, apenas eu me atrevo a estar desperto,
Obedecendo ao império, Grande Amor, de ti.


Do poeta latino Caio Petrônio "Árbitro" (20-66 d.C.). A tradução é do português Jorge de Sena, o que explica o "p'los cabelos" do terceiro verso.



13.12.01

CITAÇÕES FICTÍCIAS 4

"Lassie, me traz aaaalguééémmm..."

Frank Sinatra se afogando na piscina do hotel Sands, tendo por única testemunha a cadelinha Lassie. Las Vegas, 1969.

Sim, a piada é velhíssima. E é a segunda pior de todos os tempos. Só perde para aquela da "casa dos Beatles" (você sabe qual é. O Ringo não Starr, saiu pra Paul McCartney no correio. Dããã...).
CITAÇÕES FICTÍCIAS 3

"'É com você' a puta que o pariu, Sílvio!!!"

Lombardi, dez segundos após descobrir que ganhou, sozinho, a Mega-Sena acumulada. Estúdios do SBT, via Anhangüera, durante a gravação do "Qual É A Música".

RUY GOIABA'S LONELY HEARTS CLUB BAND 2

"O amor é como uma flor roxa, só nasce em coração de trouxa."

Anônimo, banheiro do Rei das Batidas, parede à esquerda de quem está sentado na privada, circa 1992.
CITAÇÕES FICTÍCIAS 2

"A ciranda inflacionária é um aspecto lúdico da economia."

Zé Ribamar Sarney, em seu prefácio a "Borrachudos É Fogo", Editora do Exército, 1989.
CITAÇÕES FICTÍCIAS 1

Sim, Ruy Goiaba chegou a um novo estágio da doença das citações: inventá-las.

Há uma explicação. Assim como as “entrevistas imaginárias” do Nelson Rodrigues, as citações fictícias têm o poder de expor os verdadeiros pensamentos de qualquer pessoa, exatamente porque ela nunca disse aquilo. Por exemplo: segundo seus biógrafos, De Gaulle jamais afirmou que o Brasil não fosse um país sério. Ora, o que ele não disse é a mais pura verdade. E sejamos honestos: se ele não disse, pensou.

Desse modo, as falsas citações são sempre muito mais verdadeiras que as reais. Aqui vai a primeira delas:

O que é isso?
Isso
O que não é isso?
Isso também
Então é isso


Carlinhos Brown, Arnaldo Antunes e Marisa Monte, "Isso é Issa". Da coletânea "Vá Tomar no Cool, volume 1".
BREGA'S BANQUET 23

Para contrabalançar, segue um impúbere e desafinado Ed Carlos:

Aaaaaaaaaaahhhhhhh
Eu estou feli-iz
Porque o
Amor
Que um dia foi embora
Agora
Voltou
Porque gosta só de miiiiiiiiiiiiiiim


"Estou Feliz", versão da Lilian "eu-sou-rebelde-porque-o-mundo-quis-assim" Knapp para "Puppet on a String".

A propósito, se você tiver aquelas fotos da Lilian na finada revista "Status", mande-me. Com isso, você me ajudará a dar um upgrade no "brega's banquet" e contribuirá para o acervo da Punheteca de Alexandria -mais uma grande, roliça e latejante iniciativa da Goiaba's Enterprises.
RUY GOIABA'S LONELY HEARTS CLUB BAND 1

Esta seção do puragoiaba trará para vocês, leitores sensíveis, as mais belas frases sobre aquele sentimento essencialmente estúpido inventado pelos poetas provençais há uns 900 anos. É, aquele mesmo que também é marca de paçoquinha.

Podemos começar com um Byron, que tal? "The sword outwears its sheath, and the soul wears out the breast, and the heart must pause to breathe."

Antes que vocês me xinguem, a tradução. A espada gasta a bainha, a alma gasta o peito. E o coração precisa parar para respirar.
Leonora, querida, não precisa amenizar nada. Aliás, a espinafração nem foi tão radical. Quem não estiver a fim de entender o Laforgue pode encontrar aqui Rimbauds e Rilkes traduzidos -e, é claro, Timóteo, Cauby, Odair etc. E quem não quiser nada disso tem total liberdade de se dirigir a outra barraca de frutas. O que seria das jacas se todos gostassem das goiabas, n'est-ce pas?

E eu jamais botaria Edith Piaf no "brega's banquet". Ela é como o Jacques Brel: quanto mais cafona, mais chique.

(Ah, concordo com você: palavras são cordas. É só me dar bastantes palavras que eu mesmo me enforco. Hehehe.)

12.12.01

Pessoal, dêem uma olhada neste link. Sim, são episódios da Bíblia contados com pecinhas de Lego. E quem clicar aí em cima irá direto à história de Ló, bêbado, em plena ralação com suas duas filhas.

Que Nelson Rodrigues, que nada. O Velho Testamento é o que há.
Tarde melancólica, boa para postar este Jules Laforgue. Vai sem tradução mesmo. Se você não é francófilo, azar o seu.

Les mains dans les poches,
Le long de la route,
J'écoute
Mille cloches
Chantant: "les temps sont proches;
"Sans que tu t'en doutes!"

Ah! Dieu m'est égal!
Et je suis chez moi!
Mon toit
Très-natal
C'est Tout. Je marche droit,
Je fais pas de mal.

Je connais l'Histoire,
Et puis la Nature,
Ces foires
Aux ratures;
Aussi je vous assure
Que l'on peut me croire!


("Locutions des Pierrots", XIV)




BREGA'S BANQUET 22

Ela é a dona de tudo,
Ela é a rainha do lar,
Ela vale mais para mim
Que o céu, que a terra, que o mar

Ela é a palavra mais linda
Que um dia o poeta escreveu
Ela é o tesouro que o pobre
Das mãos do Senhor recebeu

Mamãe, mamãe, mamãe!
Tu és a razão dos meus dias,
Tu és feita de amor e esperança
Ai, ai, mamãe,
Eu te lembro -chinelo na mão,
O avental todo sujo de ovo,
Se eu pudesse, eu queria outra vez, mamãe,
Começar tudo, tudo de novo


É difícil imaginar que o Herivelto Martins tenha escrito algo pior que "Mamãe" (o ponto alto, para mim, é o "avental todo sujo de ovo". Bleargh!).

Com Ângela Maria e Agnaldo Timóteo, então, não é uma música -é um atentado. Destaque para a citação da melodia de "When You Wish Upon a Star". Putz, Walt Disney não merecia isso.



Leonora, você está certa. Estamos contaminados pelo vírus das citações, talvez mais letal que o antraz. E, como dizia meu avô, "quem cita os outros não tem idéias próprias". Vixe!

11.12.01

Ah, aquele outro projeto também fracassou. Depois de várias tentativas, concluí que minha dupla pornossertaneja, Punheta & Siririca, é inviável. Nenhum dos dois consegue cantar e tocar ao mesmo tempo; também não foi uma boa idéia substituir a viola pelo órgão. Melhor deixar pra lá.
Quer saber? Chega de não ter dinheiro para meus projetos cinematográficos. Ninguém tem “cojones” (ooops) para subsidiar “A Ilha das Mulheres de Vagina Dentada”. E, diferentemente do Diogo Mainardi, não posso fazer merda com recursos próprios (se bem que fazê-la com o dinheiro alheio é sempre mais divertido).

Qual a solução? Aderir à empulhação fármaco-televisiva. Pensei num creme rejuvenescedor chamado Elastron, à base de melanolanina. Tente pronunciar: melanolanina. Travou a língua, né? Quanto mais impronunciável for o nome, melhor.

Um slogan: Elastron torna seu rosto jovem como bumbum de bebê. Assim, quem descobrir que se trata de creme Yamasterol reciclado não terá como reclamar.

Ora, cumprimos o prometido: deixamos você com cara de bunda. Que, aliás, você já tinha.
BREGA'S BANQUET 21

Esta merece ir na íntegra e com transcrição fonética:

Tem certas coisas que são muito perigosash
Situações um tanto quanto escandalosash
Mas sempre vale a pena até correr o risco
A vida é pra viver
Se de repente a gente encontra alguém na rua
Pode acabar até envergonhando a lua
Num dessesh lancesh muito loucosh que acabam
Num quarrrrrrto dimotel

E às vezes basta a porta aberta do banheiro
Uma tremeeenda brincadeira no chuveiro
E às vezes basta uma pergunta embaraçosa
Pra gente confessaaaaar
Quem é que nunca recebeu uma cantada?
Quem é que nunca respondeu no mesmo tom?
Quem é que nunca recebeu um biletinho
(sic)
Das mãos de um garçom?

Eu e você, assim, ao som de um bolero
Pra lá, pra cá, do jeito que eu quero
Vem cá, me dá, que eu sei aonde vaaai chegaaar
Se o corpo quer assim, assim coladinho
Pra lá, pra cá, do nosso jeitinho
Me traz, me faz, me roça e deixa aconteceeeeeeeeeer

E o que me importa o que eles vão pensar de mim?
Eu quero mais comer o fruto até o fim
Eu e você, a dois, a três,
Escancarando de veeeeeeeeeeeeeeeeeez


Elymar, mais que popular, é power brega -e o site do homem é luxo só. Confiram.


Partilho com vocês este Rainer Maria Rilke que recebi de presente. A tradução é do Paulo Quintela.

Minha vida não é esta hora abrupta
em que me vês tão açodado.
Sou uma árvore em frente do meu fundo,
sou só uma das minhas muitas bocas
e, delas, a que mais cedo se fecha.
Sou o silêncio que há entre duas notas
que só a custo se acostumam uma à outra:
porque a da morte quer elevar-se -

Mas no intervalo escuro se congraçam
ambas trêmulas.
E a melodia é bela.





10.12.01

'Cês viram? Os arquivos voltaram, e eu nem precisei apelar para o velho Max. O nome de Genésio é poderoso!
Co'os diabos, meus arquivos sumiram! Só podem ser as "forças maligna" de que o Coffin Joe fala.

Terei de usar todo o conhecimento adquirido no meu curso de exorcismo por correspondência. Sai, arrenegado! Sai deste blog, que ele não te pertence!

Hum... acho que não vai dar pé. Melhor chamar o Max von Sydow.
BREGA'S BANQUET 20

Guarda essa minhoquinha, Severino
Pra que é que isso dá?
Tão pequena que nenhum peixe belisca
Além disso, não dá isca
Pra quem gosta de pescar


É claro que Clemilda está no panteão do puragoiaba! Rainha do pornoforró e autora do clássico "Prenda o Tadeu" ("ele pegou a minha irmã e... crau!"), ela também compôs "Isca de Anzol", reproduzida acima.

Essa é, de longe, sua letra mais sutil. Mas eu prefiro um forró cujo título me escapa, o do "seu Clemente" -aquele que só quer trabalhar "co'menas gente".
FRASE DO DIA

"Antigamente as coisas eram piores. Depois foram piorando."

Essa máxima é atribuída ao Paulo Mendes Campos, mas eu não consegui localizar o texto do qual ela foi extraída. Se você souber, é favor avisar. Deus lhe pague, viu?
BREGA'S BANQUET 19

Desta maneira eu não posso lecionar
Há uma aluna que eu estou a namorar
Seu diretor, não queira estar no meu lugar
Nem a história do Brasil eu sei contar

Essa garota não me deixa respirar
Nove-vez-nove já não sei multiplicar
As minhas pernas começaram a tremular
Eu vou parar, eu vou parar,
Eu vou parar de lecionaaaar


Que "Don't Stand So Close to Me", que nada! Mais de uma década antes do ecochato Sting, nós já tínhamos o "Professor Apaixonado". Nílton César rocks!







BREGA'S BANQUET 18

Papai, ai, que calor
Calor na bacurinha
Calor -não é na tua
Ai, ai, papai, só é na minha...


'Cê já ouviu essa pérola da Maria Alcina? Então há de concordar comigo. É mais eficaz que aquelas pastilhas purgativas do poema do Bandeira.
Pois é, senhores, a vida dos goiabas nem sempre é fácil. Eu já deveria ter acrescentado ao blog links para quem queira chafurdar na cafonice da net. E outros links para blogs pelos quais passeio. Algumas fotos, talvez. Não fiz nada disso até agora, por absoluta falta de tempo. Claro que o fato de eu ser uma tecnocapivara ajuda, mas não é determinante.

Enfim, enquanto não consigo incrementar minhas receitas, fiquem com esta bananada de goiaba bem básica. Solta o intestino que é uma beleza, meu filho.



7.12.01

Leo, como é que eu posso retribuir um presente assim bonito? Ainda mais hoje, que me sinto pobre e pouco inspirado, sem nada no bolso ou nas mangas.

De todo modo, você sabe: "Onde não há jardim, as flores nascem de um secreto investimento em formas improváveis". E o jardim do Drummond é tão vasto que uma flor a menos mal será notada. Fique com ela -e com um beijo.
Que fique claro: nada contra os baianos. Seria absurdamente preconceituoso. Gordurinha era, Caymmi e Riachão ainda são -para citar apenas alguns pouquíssimos exemplos.

Infelizmente, ACM e sua versão tropicalista também nasceram lá. Mas a Bahia, terra primeira, não tem culpa disso.
Leonora, você acertou na mosca. Foi exatamente por isso que criei a "bananada de goiaba": para abrigar coisas que, sem ser, ahn, "alta cultura", estavam muito longe do "brega's banquet".

Obrigadíssimo pela reprodução da minha "carta de intenções". Pequena divergência: não morro de amores pela Clarice, mas não seria tão severo com a obra dela. Quanto ao Baiano Meloso, esse usurpador da arte brega's banquet, subscrevo integralmente suas palavras. Como disse o Zeitgeist, esse rapaz morreu em 1971 -e poucos se deram conta disso.
BEN JOR REVISITADO

Os hermeneutas estão chegando
Estão chegando os hermeneutas
Os hermeneutas estão chegando
Estão chegando os hermeneutas


Uma vez, o Luís Fernando Veríssimo escreveu que o termo "hermeneutas" parecia designar uma seita de andarilhos herméticos. Eu concordo. Por isso ele fica tão bem na letra de "Os Alquimistas Estão Chegando os Alquimistas". Não acha?
BREGA'S BANQUET 17

Quero saciar a minha sede
No desejo da paixão que me alucina
Vou me embrenhar nessa mata só porque
Existe uma cascata que tem água cristalina
Aí, então, vou te amar com sede
Na relva, na rede, onde você quiser
Quero te pegar no colo,
Te deitar no solo e te fazer mulher...


"Deixa Eu Te Amar", sozinha, basta para elevar Antônio Gílson Porfírio, o imortal Agepê, ao nosso panteão.
BANANADA DE GOIABA 4

Domingo nóis fumo num samba no Bexiga
Na rua Major, na casa do Nicola
À mezzanotte o'clock, saiu uma baita duma briga
Era só pizza que avoava junto co'as brachola
Nóis era estranho no lugar e não quisemo se meter
Não fumo lá pra brigar, nóis fumo lá pra comer
Na hora H, se enfiemo debaixo da mesa
Fiquemo ali, que beleza,
Vendo o Nicola brigar (laiarará)
Dali a pouco escuitemo a patrulha chegar
E o sargento Oliveira parlar:
"Não tem 'portância, vou chamar duas ambulância"

(breque)
"Pessoal, a situação aqui é cínica. Os mais pior vão pras Crínica"

Claro que é Adoniran Barbosa. Quem mais poderia ser?


BREGA'S BANQUET 16

Estou apaixonado, apaixonado estou
Estou apaixonado, apaixonado estou
Pela dona do primeiro andar
Pela dona do primeiro andar
Pela dona do primeiro andar
Pela dona... do primeiro andar


No começo, os Originais do Samba estavam mais para bananada de goiaba do que para brega's banquet. Eles cruzaram a fronteira entre esses dois "gêneros" com "A Dona do Primeiro Andar" e a clássica "O Assassinato do Camarão":

Assassinaram o camarão
Assim começou a tragédia no fundo do mar
O caranguejo levou preso o tubarão
Siri seqüestrou a sardinha tentando fazer confessar
O guaiamum, que não se apavora,
Disse: "Eu é que vou investigar!
Vou dar um pau nas piranhas lá fora,
Vocês vão ver, elas vão ter que entregar"...


Mas a obra-prima dos caras é mesmo "Aniversário do Tarzan", que inclui cenas de homossexualismo explícito ("o Zorro chegou beijando o Sargento Garcia...") e a participação especial do Cebolinha, cantando "palabéns pla você".

Não acredita? Pois vá à Usina do Som e ouça.

Como diria o Mussum, putaquepariuzis.





6.12.01

BANANADA DE GOIABA 3

Mais Monsueto? Pois não. Ele foi o cara que popularizou -se não inventou- o uso de "morar" como sinônimo de "perceber", desde "Mora na Filosofia", que é de 1955 (pois é, os roqueirinhos devem achar que isso era coisa da Jovem Guarda). É ele quem faz aquele vocal, digamos, dadaísta na primeira gravação de "A Tonga da Mironga do Kabuletê", de Vinicius e Toquinho -para mim, a melhor parte da música (sorry, poetinha).

E Monsueto também foi vítima de uma "sanitização" por parte de, ahn, luminares da MPB. Alayde Costa e Milton Nascimento gravaram, em 1972, uma versão desnecessariamente clean de "Me Deixa em Paz", primeiro sucesso dele.

Essa música com o Monsueto é outra história. Percussão fortíssima, trombone e corinho de lavadeiras. Nunca ouvi uma interpretação tão para cima de uma letra tão para baixo:

Se você não me queria, não devia me procurar
Não devia me iludir nem deixar eu me apaixonar
Evitar a dor é impossível
Evitar este amor é muito mais
Você arruinou a minha vida
Ora, vá, mulher, me deixa em paz


E isso é um carnaval, moçada. Se tocada num enterro, é capaz de fazer o defunto se levantar e sair sambando.

BANANADA DE GOIABA 2

E, já que estou no embalo da música popular bananosa, mais um post, desta vez para louvar o grande Monsueto. Quem conhece "A Fonte Secou", "Mora na Filosofia", "Lamento da Lavadeira" e outros ótimos sambas sabe do que se trata. Mas o que eu quero deixar aqui é este trechinho de uma música menos conhecida, "Morfeu":

O deus da chuva faz chover quando quer
O deus do vento faz ventar quando quer
Eu caí nos braços de Morfeu
E ela se entregou a Lucifér


A pronúncia é "Lucifér" mesmo. Não é literalmente do capeta?

BANANADA DE GOIABA 1

Só vendo como é que dói
Só mesmo vendo como é que dói
Trabalhar em Madureira, viajar na Cantareira e morar em Niterói


Não é brega's banquet, de jeito nenhum. Mas deu vontade de citar. Gordurinha é gênio da raça; já o seria se tivesse composto apenas "Chiclete com Banana", a canção. Procure as versões dele e/ou do Jackson do Pandeiro -evite a do Gil, que é de uma absoluta sem-gracice (desculpem, gilbertófilos).

Ah, isso aí em cima é um trechinho do "Mambo da Cantareira".

BREGA'S BANQUET 15

Feiticeira, feiticeira
Feiticeira é essa mulher que por ela gamei
Feiticeira, feiticeira
Eu não posso negar o feitiço que ela me fez


Carlos Alexandre tem apenas dois greatest hits: esse e "Ciganinha" ("Você é ciganinha/ Dona do meu coração/ Não tenho sangue cigano/ Mas vou pedir a sua mão..."). São suficientes para elevá-lo ao nosso Olimpo.
Leonora, eu estou aplaudindo. Dá para ouvir daí?

Já que estávamos falando de Joyce, eis um aqui para você.

A Flower Given to My Daughter

Frail the white rose and frail are
Her hands that gave
Whose soul is sere and paler
Than time's wan wave.

Rosefrail and fair -yet frailest
A wonder wild
In gentle eyes thou veilest,
My blueveined child.

5.12.01

MANUAL DE INSTRUÇÕES

"Love me, love my umbrella."

(James Joyce, em "Giacomo Joyce")

E não só eles. "Birds do it, bees do it, even educated fleas do it." Goiabas também, mas apenas no mau sentido.
O verbo vai escrito com "ph" apenas para nos lembrarmos da incrível antigüidade desse ato. Vocês, roqueirinhos, filhos da "revolução sexual", não sabiam disso? Pois é -há milênios que os seres humanos se phodem. Em todos os sentidos.
BREGA'S BANQUET 14

E chega de Kurt Weill, Shakespeare e frescuras similares. Veja só do que este blog, o Doladelá, se lembrou:

Comprei um quilo de farinha
Pra fazer faró
Pra fazer faró
Pra fazer faro-fa-fá

Comprei um pé de porco
E orelha de porco
Levei tudo pro fogo
E remexi direito
Com a fome de um lobo
Eu calcei o meu peito


Não sei o que mais me espanta nessa obra-prima do Mauro Celso. Talvez seja a riqueza das rimas. "Pé de porco" com "orelha de porco" não é nem de fornicar. É de phoder, mesmo.




Pouco mais de três séculos depois, Ogden Nash (letrista de Kurt Weill, aquele grande parceiro do Bertolt Brecht) trocou o "if" dessa frase por um "when" e fez uma das letras mais lindas da música popular.

Vou transcrevê-la, apesar de estar completamente fora do espírito brega's banquet. E você, que com razão não vê muita graça em letras sem música, vá atrás da gravação da Sarah Vaughan, ao vivo, nos anos 50. É de comover uma pedra.

Speak low
When you speak love
Our summer day
Withers away
Too soon, too soon

Speak low
When you speak love
Our moment is swift
Like ships adrift
We're swept apart too soon

Speak low
Darling, speak low
Love is a spark
Lost in the dark
Too soon, too soon

I feel wherever I go
That tomorrow is near, tomorrow is here
And always too soon

Time is so old
And love, so brief
Love is pure gold
And time a thief

We're late
Darling, we're late
The curtain descends
Everything ends
Too soon, too soon

I wait,
Darling, I wait
Will you speak low to me
Speak love to me and soon


MANDAMENTO

"Speak low, if you speak love."

Mais um Balançalança para vocês. Confiram em "Much Ado About Nothing".

4.12.01

BREGA'S BANQUET 13

Sentada na porta em sua cadeira de rodas ficava
Seus olhos tão lindos sem ter alegria, tão triste chorava
Mas, quando eu passava, a sua tristeza chegava ao fim
Sua boca pequena no mesmo instante sorria pra mim

Aquela menina era a felicidade que eu tanto esperei
Mas não tive coragem e não lhe falei
Do meu grande amor _e agora por onde ela anda eu não sei

Hoje eu vivo sofrendo e sem alegria
Não tive coragem bastante pra me decidir
Aquela menina em sua cadeira de rodas
Tudo eu daria pra ver novamente sorrir


Fernando Mendes é hardcore brega. E quem ousaria duvidar disso?



POLITITICA

Curioso: fiquei com vontade de fazer um post político. Bem, o que eu tenho a dizer sobre o assunto já foi dito em dois versos lapidares do e.e.cummings. Seguem, com a tradução do Augusto de Campos logo depois:

a politician is an arse upon
which everyone has sat except a man


um político é um ânus no
qual tudo se sentou exceto o humano



BREGA'S BANQUET 12

Nesse corpo meigo e tão pequeno
Há uma espécie de veneno
Tão gostoso de provar
Como pode haver tanto desejo
Nos seus olhos, nos seus beijos,
No seu jeito de abraçar
E foi com isso que você me conquistou
Com esse jeito de menina
E esse corpo de mulher
E nada existe em você que eu não ame
Sou metade sem você
Mon amour, meu bem, ma femme


É claro que Reginaldo Rossi não poderia ficar de fora do panteão cafona deste puragoiaba. Confiram a frase que está na abertura do site do nosso herói: "Homem que é homem tem que babar o saco das mulheres. Ver ela sair com outro e pedir: querida, volta que eu te amo!".


Perfeito, bela e cândida Leonora. Respeito sua opinião, mas ainda fico com o corvo do Milton Amado. "O fogo agônico animava o chão de sombras fantasmais" é pura delícia auditiva. E eu acho que "fogo agônico" tem muito mais a ver com o Poe do que "chama no fogão". Enfim, viva a diversidade.

3.12.01

BEBIDAS POPULAR

E chega por hoje. Vou encher a cara de vinho Chapinha. Quem disse que goiabas não gostam de viver perigosamente?
COMIDAS POPULAR

Existe alguma espécie de comida mais hedionda que o churro? Coisa abominável, principalmente no aspecto -não conheço nada que se pareça mais com um filete de bosta (exceto, é claro, o próprio). O cheiro também é nauseante. E, para completar, a concordância é puro paulistês -o churros, o chopps, o shorts etc.

Mas sabem de uma coisa? O churros tem todos os atributos para ser um dos pratos-símbolo do puragoiaba. É o que, por exemplo, Odair José seria se fosse um doce (sem trocadilho, por favor). Portanto, longa vida ao churros!

E vivas para o sucos natural, o doces caseiro e o lanches árabe. Pela concordância popular. Pau no cu do Pasquale.
CONTRA O POP 7

E, antes que eu me esqueça, pau no cu dos Strokes.
CONTRA O POP 6

Há pouco tempo, foi lançada nos EUA a provável última gravação ao vivo do saxofonista John Coltrane ("The Olatunji Concert: The Last Live Recording"). É um show de abril de 1967, três meses antes da morte de Trane, em que ele é acompanhado por Alice Coltrane, sua mulher, no piano, Pharoah Sanders no sax tenor, Jimmy Garrison no baixo e Rashied Ali na bateria.

São só duas músicas, de mais ou menos meia hora cada uma ("Ogundé", baseada num tema brasileiro, e uma irreconhecível "My Favorite Things") e não muito bem gravadas. Mas o barulho que Coltrane e Sanders fazem é sobrenatural (sim, senhores, todos os instrumentos eram acústicos). É a trilha sonora perfeita para um massacre da serra elétrica -ou para afugentar os vizinhos num raio de cinco quilômetros da sua casa.

E tem roqueirinho bundão que acha que sabe fazer barulho. Se você é um deles, faça-se um favor: compre esse CD e enfie a guitarra no saco.
CONTRA O POP 5

Se há uma coisa que me irrita nos roqueiros é sua habitual pretensão de reinventar a roda. Claro: quem acha que o sexo foi inventado na década de 60 e a música ocidental começou com os Beatles (quem?) não poderia agir de modo diferente.

Por exemplo: não é difícil que algum grupo punk já tenha gravado uma música chamada "Lick My Arse". Mas, queridos, Mozart já estava lá, 200 anos antes.

Eu sou mais o Johnny Rotten de Salzburgo. Wolfgang, never mind the bollocks.
BREGA'S BANQUET 11

Mais uma transcrição fonética:

Hummm, mas se um dia eu chegar muito estranhuuu
Deixa essa água no corpo lembrar nosso banhuuu
Hummm, mas se um dia eu chegar... muito louco
Deixa essa noite saber que um dia foi poucuuuuuuuuuuuuu
Cuida bem de mi-im
E então misture tudo... dentro de nós
Porque ninguém vai dormir nossos sonhuuuuus


Dalto -para ouvir no carro, com o volume no talo.

"Muito Estranho" é mesmo de fornicar. No mau sentido.
Zeitgeist, meu caro, está cientificamente comprovado: a potência do aparelho de som de um carro é sempre inversamente proporcional ao bom gosto musical do proprietário.

Se eu fosse uma goiaba subsidiada, concorreria ao Ig Nobel com essa pesquisa. Mas eu não consigo nem dinheiro para filmar "A Ilha das Mulheres de Vagina Dentada". Tudo é mais difícil quando a gente não é o Guilherme Fontes, né não?
Ei, Lenora (ooops, Leonora), obrigado pelo Neruda!
E eu sei que o objetivo da comparação entre os corvos era ressaltar o talento poético do Alexei Bueno. Mas me diga, se puder, qual é o seu corvo preferido em português. Fiquei curioso.

2.12.01

BREGA'S BANQUET 10

Quer saber? Chega de alta cultura, baby. Para fechar o domingo, fiquem com este adequadíssimo Ângelo Máximo. Tento, mais uma vez, transcrever foneticamente:

Meu domingo alegre vai ser
Pois pretendo sair com você
Iê, iê, iê, que dia fe-liz

De mãos dadas vamos andar
Muitos beijos iremos trocar
Iê, iê, iê, que dia fe-liz

Rá! Rá! Rá! Hoje é meu diiiaaa
Eu vou ter, ter, ter o seu amo-oor
Para ser, ser, ser feliz a seu lado
Uou-uou, aaaaahhh, que dia fe-liz
E, já que eu e Leonora citamos Ivo Barroso e Alexei Bueno, vamos a uma intersecção: "O Corvo e suas Traduções".

Esse livro (organizado por Barroso e lançado em 1998) inclui -é claro- o "Raven" original, do Poe (que você pode ler aqui), as versões em prosa de Baudelaire e Mallarmé e várias traduções para o português. Estas começam pela do Machado de Assis (que importou alguns erros do Baudelaire) e terminam pela do Alexei, que é a mais recente.

"O Corvo" do Alexei Bueno, de fato, supera o do Fernando Pessoa em muitos pontos. Mas eu concordo com a opinião do Ivo Barroso (e do Carlos Heitor Cony, que fez a apresentação do livro): a melhor versão em português é a do mineiro Milton Amado, que também foi um grande tradutor do La Fontaine e passou a vida escondido na província (sorry, mineiros). Confiram duas estrofes, a primeira e a sétima:

Foi uma vez: eu refletia, à meia-noite erma e sombria,
a ler doutrinas de outro tempo em curiosíssimos manuais,
e exausto, quase adormecido, ouvi de súbito um ruído,
tal qual se houvesse alguém batido à minha porta, devagar.
"É alguém -fiquei a murmurar- que bate à porta, devagar;
sim, é só isso e nada mais."


(...)

Abro a janela e eis que, em tumulto, a esvoaçar, penetra um vulto:
-é um Corvo hierático e soberbo, egresso de eras ancestrais.
Como um fidalgo passa, augusto, e sem notar sequer meu susto,
adeja e pousa sobre o busto -uma escultura de Minerva,
bem sobre a porta; e se conserva ali, no busto de Minerva,
empoleirado e nada mais.


Enfim, os leitores que julguem. E, se virem esse livro dando sopa, comprem. Vale o investimento.
'Cês querem a tradução? Aqui vai, feita pelo Ivo Barroso (Arthur Rimbaud, "Prosa Poética", Topbooks, 1998):

"É a vigília, contudo. Acolhamos todos os influxos de vigor e de autêntica ternura. E à aurora, armados de uma ardente paciência, entraremos nas cidades esplêndidas."
A delicadeza de Leonora Espanca, mais uma vez, me põe em apuros. Claro, retribuir um lindíssimo Paul Celan é o que se pode chamar "doce problema".

Então, vamos tentar. É chapéu velho, mas mantém sua beleza:

"Cependant c'est la veille. Recevons tous les influx de vigueur et de tendresse réelle. Et à l'aurore, armés d'une ardente patience, nous entrerons aux splendides villes."

Ardente paciência, amiga. Não sei se ainda haverá cidades esplêndidas -mas quem sabe um naco de sol, ainda que muito escondido, tenha sobrado para nós.

Ah, sim, senhores: isso é Rimbaud. O "Adeus" de "Une Saison en Enfer".