PEQUENA ANTOLOGIA GOIABAL 27
Jonathan Swift (1667-1745)
"Os Adoradores dessa Deidade [o alfaiate] tinham também codificado o seu Sistema de Crença (...). Consideravam o Universo um grande
Traje Completo que
veste todas as Coisas: que se
veste a Terra de Ar, que o Ar se
veste de Estrelas e as Estrelas são
vestidas pelo
Primum Mobile. Olhando-se para esse Globo de Terra, ver-se-á que ele constitui uma
Roupa muito bem acabada e de bom-tom. O que é isso que alguns chamam de
Solo senão uma bela
Túnica guarnecida de Verde? O que é o Mar senão um Colete de Seda ou de Tafetá ondeado? (...) Para concluir, o que é afinal o próprio Homem senão um
Microcostume, ou antes uma Vestimenta inteira e munida de todos os Complementos? Quanto ao seu Corpo, não há como haver polêmica; examine porém as Aquisições da sua Mente e você verá que elas contribuem, todas e em Ordem, para fornecer uma Roupagem precisa: para encurtar os exemplos, a Religião não é uma
Capa, a Honestidade um
Par de Sapatos que se gastam na Lama, o Amor-Próprio um
Sobretudo, a Vaidade uma
Camisa e a Consciência uma
Calça que, embora sirva para cobrir a Indecência e a Lascívia, facilmente é arriada para servir às duas?"
"Tenho uma Palavra a dizer a Propósito dos
Escritores Profundos, que ultimamente se tornaram tão numerosos e entre os quais sei bem que a Sociedade judiciosa já decidiu me incluir. Concebo, pois, quanto a essa questão de ser
Profundo que com
Escritores se dá como com os
Poços; uma Pessoa de bons Olhos pode ver até o Fim da Fundura, desde que lá ocorra um pouco de
Água; mas muitas vezes, quando no Mundo de Baixo nada existe além de
Terra e
Secura, ainda que esteja apenas a Jarda e meia do Solo ele há de passar por uma
Profundeza assombrosa, simplesmente por ser, e não por melhor Razão, assombrosamente
Obscuro."
(Dois trechos do panfleto satírico "Uma História de um Tonel", 1704. As maiúsculas e os trechos em itálico estão no original e foram preservados pelo tradutor, Leonardo Fróes.)